Em seu centésimo sexto capítulo, a novela "Sete Vidas" chega ao fim nesta sexta-feira (10). Com sua segunda trama no horário das seis, Lícia Manzo repete o sucesso de "A Vida da Gente", ambas elogiadas tanto pelo público quanto pela crítica. Em conversa com o Purepeople, a autora faz um balanço final do folhetim e fala sobre uma das características mais fortes de sua obra, o conflito interno dos personagens: "Os maiores e mais importantes acontecimentos, acredito, ocorrem no íntimo de cada um". Fique por dentro do que acontece no último capítulo e confira abaixo a entrevista completa!
Purepeople: Que avaliação você faz de "Sete Vidas", expectativas alcançadas?
Lícia Manzo: Saio deste trabalho com minha crença renovada no poder da colaboração, da parceria. 'Sete Vidas' deve muito a cada ator, autor, diretor e técnicos envolvidos no processo. Cada um fez da novela o seu projeto pessoal. O que estava sendo dito ali me pareceu ser relevante para cada um. Todos trabalharam com entrega e envolvimento por este projeto.
Você acompanha os comentários do público sobre a novela pelas redes sociais?
As redes sociais cumprem um papel importante na TV: é um fórum vivo, democrático. Uma ferramenta muito interessante para autores, atores, direção.
A torcida do público se divide entre Miguel ou Vicente e Pedro ou Felipe. Desde a sinopse você já sabe quem vai ficar com quem, ou decide ao longo da trama? A torcida do público influencia de alguma maneira?
Conhecer previamente o final de qualquer trama ou personagem tiraria para mim a graça de escrever. É claro que existe um planejamento, mas o processo é feito de surpresas, imprevistos, descobertas. Por mais que um navegador saia para o mar de posse de uma carta náutica e com uma rota pré-estabelecida, é seu instinto e interação com o mar que irão desenhar a viagem.
O que você acha sobre a crítica de que "falta testosterona" em "Sete Vidas"?
Ao ser criticado certa vez por seus diálogos supostamente pobres, Nelson Rodrigues respondeu a um jornalista: 'Você não sabe o quanto me custa empobrecê-los'. No caso dos personagens masculinos de 'Sete Vidas', me ocorre parafrasear Nelson na medida em que cada rachadura, imperfeição ou vulnerabilidade que neles existe partiu de uma decisão dramática medida e pesada de minha parte. Poderia, claro, ter optado por desenhar tipos seguros, assertivos, heróicos, mas personagens instáveis, ambíguos e vulneráveis, sempre parecerão para mim mais interessantes, humanos ou reais. No caso do comentário em questão, me parece curioso que a mesma qualidade frágil, instável, confusa, não tenha sido também percebida nas personagens femininas da novela, já que houve um esforço consciente de minha parte para desenhá-las também desta forma. Minha intenção foi fazer de Lígia, a protagonista, uma mulher afetivamente subjugada a um homem que entra e sai de sua vida a seu bel prazer. Júlia, a protagonista jovem da trama, chega a casar-se no início para atender a um anseio de sua mãe, Marta. Do mesmo modo, Irene consome a vida no trabalho para atender às expectativas de sua mãe, Dália, uma dona de casa frustrada. Marlene, por sua vez, acoberta as falhas do namorado abusador por temer ficar sem um parceiro. Mesmo na trajetória de Marta e Eriberto: ela atravessou a trama do mesmo modo abusador, defendido; ele buscou o tempo todo fazer da relação dos dois algo de verdade, e, ao final, teve a coragem, a bravura, de deixar seus temores para trás e assumir o que sente – o que para mim é demonstração de força e não o contrário.
No Twitter, muitas pessoas comentam seu encantamento por "Sete Vidas" não ter um vilão. O conflito interno e o drama criado pelas situações da vida seriam uma espécie de digital da sua dramaturgia?
John Cassavetes escreveu uma vez: "O que interessa para mim não é como as pessoas enganam umas às outras, mas como elas enganam a elas mesmas'. Meu interesse na vida e na arte tende a ser exatamente o mesmo.
A cena do karaokê com Lígia e Miguel lembra muito uma cena de "A Vida da Gente", com Manu e Gabriel, em que ficam na dúvida se a música é de Chico ou Caetano. Foi coincidência ou é mesmo uma homenagem?
Sim, a situação é basicamente a mesma: lá, a discussão era a respeito de 'Samba e Amor' - uma canção de Chico Buarque às vezes atribuída a Caetano Veloso; aqui a aposta surge a partir de 'Você não entende Nada' – canção de Caetano que é atribuída a Chico em cena. Tudo o que escrevo, acredito, termina contaminado por Caetano, Chico, Beatles, Tom Jobim - minhas admirações maiores, confessas - e talvez por isso a tentativa de repetir a homenagem.
(Por Samyta Nunes)