Manoel Carlos está aposentado das novelas há 10 anos e nesta sexta-feira (3), o público tem a chance de recordar grandes trabalhos do autor no "Tributo" (Globo, 23h15). Aos 91 anos, portador de uma doença sem cura, e tendo encarado fortes dramas na vida pessoal, foi Maneco, como é carinhosamente chamado, o novelista que imortalizou as Helenas na dramaturgia brasileira.
Na Globo, Nívea Maria foi a pioneira, Maria Helena, em "Maria, Maria" (1978), e Julia Lemmertz, a última ("Em Família", 2014), enquanto Regina Duarte por três vezes viveu uma Helena ("História de Amor", 1995; "Por Amor", 1997; e "Páginas da Vida", 2006). Sem esquecer Tais Araújo (em "Viver a Vida", 2009), Vera Fischer ("Laços de Família", 2000), Maitê Proença ("Felicidade", 1991) e Christiane Torloni ("Mulheres Apaixonadas", 2003).
Em "Sol de Verão" (1982/1983), porém, nenhuma personagem foi batizada com o nome. E essa mesma novela acabou marcada por uma grande tragédia que abalou Manoel Carlos e fez o autor tomar uma forte decisão. O Purepeople viaja 42 anos no tempo e te conta.
"Sol de Verão" girava sua trama ao redor de Rachel (Irene Ravache), que resolve se separar do marido, Virgílio (Cécil Thiré, ator morto em 2020), e chegando no Rio de Janeiro conhece o dono de uma oficina mecânica. Heitor (Jardel Filho) é irmão de Irene (Beatriz Lyra) e com ela mora em sobrado.
Apesar das diferenças, Heitor acaba por conquistar Rachel, mãe de Clara (Débora Bloch). A jovem, por sua vez, não dá o menor apoio ao romance, enquanto Virgílio faz de tudo para ter a ex-mulher de volta.
No dia 19 de fevereiro de 1983, uma tragédia na vida real abalou a novela. Intérprete de Heitor, Jardel Filho morreu aos 56 anos após um infarto agudo e edema pulmonar. O ator estava dormindo ao morrer e um dia antes por conta de uma forte gripe precisou faltar as gravações.
"Eram 4h quando ele acordou passando mal. Dei-lhe remédio e tirei sua pressão. Como ele disse que se sentia melhor, fui dormir. Acordei às 9h, dei-lhe um suco de maçã com leite, ele me disse que estava melhor e fui arrumar a casa. Às 11h o telefone tocou no quarto e fui atender. Era minha mãe. Vi que o Jardel estava roxo e comecei a gritar. Avisei os vizinhos e eles chamaram uma ambulância. Não posso acreditar no que aconteceu. Ele estava tão bem antes de ter essa febre", relatou Cecília Notari, mulher dele, ao "O Globo".
Jardel foi velado no Theatro Municipal e enterrado no Cemitério São João Batista, deixando duas filhas (Tânia e Adriana). O caixão com o corpo deixou a casa do artista sendo carregado por Maneco, Tony Ramos, Edney Giovenazzi, Paulo Figueiredo, e Edwin Luisi.
A morte de Jardel trouxe várias mudanças. Abalado, Manoel Carlos decidiu deixar a trama, sendo substituído por Lauro César Muniz, sob assessoria de Gianfrancesco Guarnieri (1934-2006). Depois, "Sol de Verão" perdeu 14 capítulos. Ao mesmo jornal, dia 27 daquele mês, Maneco fez uma longa despedida ao artista.
"Falam muito que o espetáculo não deve parar e que você, se vivo fosse, gostaria que fosse assim. Não sei. Até pode ser. Mas eu estou na pior, sem condições - e você há de me perdoar se eu não conseguir escrever nem mais uma linha para 'Sol de Verão'. Acho que estou saindo da novela junto com você. Não porque eu queira, mas porque não está dando mesmo para segurar esta barra. Muitas vezes o grande desafio é dizer não. Perdoa este seu pobre amigo, este modesto parceiro de sua gloriosa despedida", afirmou.