"Não basta não ser racista, é preciso ser antirracista": a frase da professora, filósofa e militante Angela Davis dominou a web na "Blackout Tuesday", em junho deste ano, em meio às manifestações do movimento "Black Lives Matter". No Dia da Consciência Negra, a reflexão volta a se evidenciar: como ser antirracista na prática? Para responder essa pergunta, o Purepeople destaca declarações potentes e necessárias de personalidades do Brasil e do mundo sobre a importância de se posicionar de modo contrário à discriminação racial.
A cantora de 25 anos já foi alvo de ataques preconceituosos na web. Por lá, questionou seus seguidores. "Você ouve nossa música, mas e no dia a dia, onde estão seus amigos pretos? Com quantos pretos você convive? Como você contribui para mudar esse sistema - porque, sim, o racismo é estrutural", apontou a artista. "Nosso sistema foi construído em cima dele. E não, só postar quando convém não é o que vai mudar de fato nossa sociedade. Se você se cala diante da injustiça, você também está compactuando com ela", destacou.
Referência quando o assunto é empoderamento, a jurada do "The Voice Brasil " ponderou sobre representatividade na TV. "As pessoas têm aquele receio de se expressarem da forma que elas gostariam de se expressar, mas isso que aconteceu comigo não significa que o racismo acabou, por eu estar numa capa de revista, na TV, isso significa que estamos caminhando, mas que temos muita coisa pra fazer", afirmou a artista de 30 anos. Ela reforçou: "A gente precisa se ver nos lugares para saber que pode estar onde quiser estar". Veja abaixo!
O ator global - um dos destaques do especial "Falas Negras", exibido na noite desta sexta (20) - ponderou sobre a importância da continuidade da luta antirracista. "Hoje a galera simplesmente falou 'chega', e que pena que a gente teve que chegar nesse ponto. Não vai parar agora, porque tem que ser normal ver um preto em um lugar de destaque. As cotas existem para equilibrar. Eu quero uma educação digna para que as cotas um dia não sejam necessárias. A gente não vai se entender se a gente não falar", argumentou Babu.
Vencedora do "BBB20", a médica Thelma de Assis, de 36 anos, conquistou bem mais do R$ 1,5 milhão. "Mais do que o prêmio, na verdade, e de quando saí, sobre a representatividade que gerou, foi o orgulho de ter passado a mensagem de superação. Não me subestime por eu ser mulher. Não me subestime pela minha cor. Passar essa mensagem de querer, poder e vencer, que era o que a minha mãe me passava quando eu tinha a idade da Títi, é o maior prêmio", contou em entrevista a Giovanna Ewbank.
A atriz, em suas redes sociais, apontou a crueldade gerada pela desigualdade racial. "São gerações após gerações, filhas após mães, filhos após pais, lágrima após lágrima, sofrimento após sofrimento. Perdas após perdas", afirmou Taís. A artista de 41 anos, intérprete de Marielle Franco no especial "Falas Negras", ainda aconselhou: "Se você se diz antirracista é importante que você saiba que você vai ter que ser firme. Vai ter que ter coragem e que você tem muito trabalho pela frente, seja bem-vindo".
Casado com Taís, Lázaro destacou o papel de pessoas brancas na luta contra o preconceito. "Acredito que a escuta é um lugar muito importante dos não negros para entender os outros lugares. Não que ele precise anular a sua dor. As dores estão aí e elas precisam ser trabalhadas. Mas o não negro precisa entrar em contato também com a escuta. Geralmente um não negro percebe a sua branquitude quando um negro, através da sua dor ou seu incômodo, provoca algum incômodo nele. Só aí a pessoa levanta e percebe", afirmou o baiano de 42 anos.
Muito ativa em causas sociais, a atriz carioca valorizou a união no antirracismo. "A melhor forma de se contrapor ao nosso histórico racializado de tanta dor, é entender que branquitude e negritude precisam estar juntas", opinou Camila.
A mineira de 35 anos se destacou em produções nacionais como "Amor de Mãe" e "O Outro Lado do Paraíso" e já levantou questionamento sobre a representatividade negra na TV. "Me diz, quantas mocinhas negras existem?! Provavelmente você contará na palma da mão. É muito pouco perto da realidade da nossa sociedade, do nosso país, e é muito importante termos espaços de destaque", disse Erika .
Considerada uma das revelações mais promissoras da dramaturgia nacional, Jéssica levantou a importância do autoquestionamento. "As pessoas precisam sair da zona de conforto. É desconfortável explicar o óbvio, dizer ao diretor que não posso fazer a cena daquela maneira porque corrobora com tal ideia. O racismo não pode mais ser um assunto só de preto. Os brancos precisam se questionar", afirmou a global.
Com um histórico marcado por superação e muita determinação, Elza, de 90 anos, declarou seu incômodo com cenário atual. "Ainda fico chocada com inúmeros casos de racismos praticados nos dias atuais. Isso só reforça que ainda temos muito o que brigar. Enquanto tiver alguém para me escutar, vou gritar para ver se consigo fazer algo por alguém que precisa, seja mulher, negro, gay... qualquer ser humano", disse.
A advogada norte-americana conquistou uma legião de fãs ao redor de todo o mundo durante o mandato de seu marido, Barack Obama, como presidente dos Estados Unidos. Após a saída dele do governo, Michelle seguiu como uma voz ativa contra a discriminação racial. "Cabe a todos nós - negros, brancos, todos - não importa quão bem-intencionados pensemos que podemos ser, fazer o trabalho honesto e desconfortável de enraizá-la. Começa com o autoexame e a escuta daqueles cujas vidas são diferentes da nossa", afirmou.
Aos 35 anos, o inglês entrou para a história da Fórmula 1 em 2020. Ele se tornou heptacampeão da categoria, conquista anteriormente alcançada apenas pelo alemão Michael Schumacher. "Ser o primeiro 'qualquer coisa' negro é uma caminhada orgulhosa e solitária", afirmou o piloto. Durante o campeonato, Hamilton protestou contra a discriminação racial em diversos momentos. "Como nação, somos rápidos em condenar ruídos de macacos e bananas atiradas em jogadores de futebol negros, mas quando se trata de resolver questões estruturais, as pessoas no poder permanecem caladas", argumentou.
O astro de Hollywood não se esquiva das cobranças por um mundo artístico mais justo na questão racial. "Vocês comprometeram-se com uma paridade de gênero 50/50 em 2020. Onde está o desafio para se comprometerem com a contratação de trabalhadores negros? Conteúdo negro, liderado por executivos negros e consultores negros", declarou em protesto realizado em Los Angeles.
Nascido na periferia de São Paulo, Emicida elencou pensadores importantes na luta contra o preconceito. "A luta antirracista no Brasil não começou agora, ela não é uma luta de cinco anos, os movimentos intelectuais e as associações elaboraram projetos e se hoje a gente está nessa condição em que eu posso dizer que, se algum avanço aconteceu, é por fruto da luta da Sueli Carneiro, Abdias do Nascimento, Maria Beatriz Nascimento, Clóvis Moura, Lélia Gonzalez", afirmou o artista, premiado com o Grammy Latino em 2020.
Com uma carreira consolidada na TV, Cris valorizou a participação de todos no combate à discriminação. "O problema do racismo não é só dos negros. Acho que a gente vive numa sociedade que ainda não entendeu isso. Ou não quer entender de alguma forma", opinou a paulistana, acrescentando: "Tem muita gente que fala: 'Ah, somos todos iguais". Não somos todos iguais! Ela é diferente de você, somos diferentes, e o que a gente busca é sermos respeitadas na nossa diferença. Acho que é esse caminho".
A apresentadora do "Jornal Hoje" destacou a necessidade de mais mulheres negras na TV. "Porque, quando tiverem muitas, você não fica com essa responsabilidade, que é muito grande. Claro que não sou a única, mas precisaríamos de mais, que me confundam, (a ponto de) de perguntarem: "Quem é aquela?" e errarem o nome, assim como erramos os das apresentadoras loiras, que, às vezes, são muito parecidas. Precisamos de proporcionalidade. Precisamos de mais gente para dizer que estamos mais equilibrados. Estamos dando passos, mas eles precisam ser mais largos", afirmou a jornalista de 42 anos.
A trajetória de 54 anos de carreira de Zezé Motta é marcada pela luta pela igualdade racial. "Certa vez ouvi da saudosa Lélia Gonzalez, 'nós não temos tempos para lamúrias. Temos que arregaçar as mangas e virar esse jogo'. E essa frase ficou definitiva na minha vida. Hoje não sofro com a discriminação racial, mas aproveito o espaço da mídia para denunciar, combater. E vejo isso como uma missão", apontou.
Em declaração recente, a atriz Lucy Ramos citou dados atuais sobre o racismo. "Ainda não vivemos em um país em que negros e brancos têm as mesmas oportunidades. Ainda não vivemos num mundo em que a cor da pele não seja uma questão. Negros morrem muito mais. De fome ou pela violência. Todos os dias. De acordo com a ONU, a cada 23 minutos, um jovem negro morre no Brasil. Setenta e cinco por cento dos jovens que morrem em homicídios são negros, que também representam 75% dos que vivem na pobreza", indicou.
Juliana, por sua vez, citou sua experiência como alvo de ataques virtuais para falar sobre a luta antirracista. "Você só consegue resolver um problema quando aceita que ele existe. Agora, a gente está concordando que o racismo existe. Temos um problema sério no Brasil que precisamos mudar. Isso me dá uma esperança. Apesar de serem episódios terríveis de ignorância explícita, espero que as pessoas vejam esses exemplos como algo muito ruim e que a gente tem que deixar para trás. Temos que pensar formas de superar isso: através da educação, da cultura", orientou.
Diante de tantas possibilidades, fica o questionamento: o que você fez hoje para deixar o mundo livre do racismo? E caso tenha dúvidas de por onde começar, fica um "conselho" de Angela Davis, já citada no começo dessa matéria. "Você tem que agir como se fosse possível transformar radicalmente o mundo. E você tem que fazer isso o tempo todo".
(Por Marilise Gomes)