Fernanda Montenegro estreia nesta segunda-feira (16), na novela "Babilônia", na pele da advogada Teresa. Na trama escrita por Gilberto Braga, Ricardo Linhares e João Ximenes Braga, ela será uma ativista casada com Estela (Nathalia Timberg) e o relacionamento homossexual das duas já vem dando o que falar desde que foi anunciado. Em conversa com o Purepeople, a atriz fala da preparação para o novo trabalho e rotina de gravações, sobre preconceito e como será a relação do casal de lésbicas. "Não tem mais as expectativas eróticas, tudo está assentado, como em qualquer casamento heterossexual", conta.
Apesar de ser considerada uma das grandes damas da TV Brasileira e de ter uma premiada e vasta carreira, Fernanda Montenegro garante que cada novo papel ainda é um desafio. "É sempre um susto. Você vê o tamanho da coisa, leva um susto e se pergunta: terei fôlego? Saberei entender esse personagem? Saberei fazê-lo de tal maneira que entendam o que eu pretendo que eles entendam, representando esse papel? São tantas perguntas...", pondera.
A preparação - 'Uma viagem supersônica para Marte'
Para encarar a pesada rotina de gravações, de segunda a sábado, a veterana conta que é preciso uma grande preparação em todos os sentidos e compara os atores a atletas: "É como se preparar para uma corrida como a São Silvestre, ou para ganhar uma competição de natação. Cada um tem a sua modalidade de preparo. No nosso trabalho, pelo menos para mim, é uma coisa de você fechar a vida nesse perído de 10 meses, fechar para balanço... Só pode pensar em alguma outra coisa se o texto estiver decorado, se as coisas estiverem encaminhadas, se já tem o domínio do seu personagem".
Com toda experiência adquirida nos muitos anos de carreira no teatro, TV e cinema, Fernanda garante que a escolha exige disciplina: "(...) Se você tem um compromisso com uma novela, tem que bloquear sua vida, entende? Mas você só está ali porque quer, não está ali alienadamente. Então, se eu fecho uma personagem de uma novela, é uma viagem supersônica para Marte".
Alimentação e atividades físicas - 'Na vida as suas necessidades vão se modificando'
No que se refere a dietas e exercícios físicos, a atriz afirma que não há segredos, mas demonstra que é preciso ter parcimônia, dentro das próprias possibilidades. "Eu caminho e trabalho longamente. E acho que essa coisa da energia, você herda ou não. Não é 'ah, vou ser enérgico', ou 'agora eu sou mole'... Não existe isso. Todo mundo tem seu DNA, suas heranças genéticas ao nascer, e depois você vai viver", opina.
E ainda que a princípio ela se pergunte se vai ter fôlego, não se preocupa em ter uma alimentação regrada: "Na minha extrema juventude eu era voraz. Trabalhava muito e comia muito. Com o passar dos anos, a coisa foi arrefecendo... Eu era carnívora! Se eu não comesse carne era como se não tivesse comido naquele dia. Agora, na minha extrema madureza (risos), eu nem ligo para carne, mas não deixo de comer. Na vida, as suas necessidades vão se modificando".
A relação de Teresa e Estela - 'Não tem mais as expectativas eróticas'
Além de se posicionar completamente contra o preconceito ou qualquer discriminação contra o relacionamento homossexual, a intérprete ressalta que o casamento de Teresa e Estela se distingue dos outros casais gays da ficção, até agora. "Não são jovens que estão se descobrindo ainda, é a consolidação de uma história que tem toda uma estrutura normal, doméstica, em que se vive em comum. Não tem mais as expectativas eróticas, tudo está assentado, como em qualquer casamento hétero", explica.
A intérprete de Teresa, que deu um selinho na parceira de cena recentemente, brinca: "O que acontece não é 'Vou dormir hoje com fulano, ou não', é muito mais o seguinte: 'Como é que eu posso, na medida que eu amo essa pessoa, ampará-la de uma crise que eu sei que ela está vivendo?' È muito mais a dramaturgia do ponto de vista do choque de existência mesmo na vida, nas crises cotidianas, do que 'ah, vou dar ou não dar essa noite' (risos).
Mesmo para Fernanda, que como tantos veteranos, passou pela censura do período ditatorial, mostrar um casal de gay em novela não é novidade, nem motivo de espanto. "Há 34 anos, na novela 'Brilhante", que eu fiz com o Dennis (Carvalho), já se falava dos casais homossexuais. Isso há 34 anos! É verdade que naquela época não se podia falar de forma a se entender plenamente. Era uma bandeira defendida com muita categoria e não era demagógica nem prepotente, não era enfiando pela goela do espectador, mas era absolutamente claro. Então, eu não acredito que ninguém mais se espante com esse negócio da homossexualidade. Não posso acreditar que depois de tanta novela com essa temática, que ainda hoje tenha esse escândalo. Acho que tem ainda uma vontade de que seja, mas não é mais um grande escândalo", relata.
'Nenhum casal é fácil'
O casamento de Fernanda Montenegro com Fernando Torres durou mais de 60 anos, o dobro do tempo que Teresa e Estela estão juntas, na novela "Babilônia". Viúva desde 2008, a atriz conta que nunca pensou em se casar novamente e fala, com brilho nos olhos, de como era sua relação com o falecido marido.
"Eu estive com um homem na minha vida por 60 anos. Não penso em me casar de novo e nem teria tempo mais na vida, nem penso... Mas nem penso mesmo! (risos). Não tem lugar para isso, porque foi um encontro de vida tão avassalador e durante tantos anos, no mesmo trabalho, dia e noite juntos... Não era fácil. Nenhum casal é fácil, não. Todo dia tinha a pergunta: 'Vale a pena?... Vamos esperar até amanhã'. E chegava amanhã, era: 'Vale a pena, sim. Vamos esperar mais um dia'... E assim se passaram 60 e tantos anos".
O glamoroso mundo da moda e das celebridades
Considerada por muitos uma diva, Fernanda demonstra valorizar pouco o glamour da profissão. Chegou a declarar recentemente que não se acha elegante e que faz as próprias unhas. De uma modéstia ímpar, ela reitera: "Eu sou uma mulher fora de moda. Porque trabalho muito para ainda ficar pensando em que grife eu vou botar, e também porque a moda muda pelo menos a cada ano. Mas a gente vai fazendo a sua moda e vai se libertando de coisas do tipo: se a saia está na coxa, se está no pé... Eu faço a minha moda".
E segundo a atriz, a boa forma e beleza são elementos necessários na teledramaturgia, mas não é só isso. "A indústria televisiva é como a indústria de cinema. Tem que ter galãs lindos de morrer, com dois metros de altura, cintura fina, bundinha pequena, peito grande. Depois, lá pelas tantas ele vai namorar uma menina que é 20 centímetros mais baixa que ele, magra e linda! Ela vai ficar peladinha... Isso faz parte de uma herança hollywoodiana, tem que ter esses pares. Mas a estrutura da coadjuvância sempre está ali, sustentando a história", afirma.
(Por Samyta Nunes)
