Zahy Guajajara, a Domingas da minissérie "Dois Irmãos", dirigida por Luiz Fernando Carvalho, acusado de agressão por um contrarrega, assim como sua personagem foi vítima de abuso sexual. Em cenas exibidas nesta terça-feira (10), a índia aparece chorando e com as roupas rasgadas após ser violentada por Omar (Matheus Abreu), rival de seu irmão gêmeo, Yaqub. A sequência do estupro, no entanto, que culmina com o nascimento de Nael (Irandhir Santos), não foi ao ar.
"Foram as cenas mais difíceis de fazer, porque eu passei por coisa parecida na minha vida. Por outro lado, isso me libertou. (A cena de assédio) não foi repetida, eu estava sofrendo tanto que o Luiz (Fernando Carvalho, diretor da produção) me poupou. Lembro que, antes de começar a gravar, eu entrava no mato, me ajoelhava, chorava, batia no chão. Fiz meu ritual para poder seguir. Mexeu com meu sentimento, parece que eu passei por isso para poder fazer essa cena. Foi uma coisa maluca, bem forte para mim", lembrou ao colunista de TV Daniel Castro, nesta quarta-feira.
A índia nascida em Barra do Corda, interior do Maranhão, se mudou para o Rio de Janeiro aos 19 anos, e se tornou ativista social quando passou a morar no Museu do Índio. Nessa época, despertou o interesse dos produtores de elenco da Globo. Depois de dois testes foi aprovada, mas quase desistiu. "Pedi demissão, não estava me sentindo bem. Me sentia fora do ambiente, não estava conseguindo me desenvolver nos ensaios. Cheguei a mandar um e-mail pedindo desculpas, me oferecendo para ajudar a encontrar outra atriz. Ninguém me menosprezou, mas eu me sentia fora do grupo, era uma coisa minha", contou.
Zahy lembrou ainda o incentivo recebido por Luiz Fernando. "Ele me disse: 'Essa é a maior oportunidade que você está tendo de fazer isso. Aqui não tem nenhum ator melhor do que você. Para mim todo mundo é igual. Você é uma atriz genuína'. Eu entrei em choro. Depois desse dia, criei uma coragem devastadora, me soltei", disse. Na trama, Domingas é empregada doméstica de Zana (Gabriella Mustafá/Juliana Paes/Eliane Giardini), mãe que não esconde sua preferência por um dos gêmeos, e Halim (Bruno Anacleto/Antonio Calloni/Antonio Fagundes) e para a casa de deles foi levada ainda criança.
Antes de seguir para a carreira de atriz, Zahy, cantora, fotógrafa e pintora, teve dificuldade em arrumar trabalho. "Quando eu cheguei no Rio, ainda era muito matuta. Tentei procurar emprego, mas não tinha ensino médio e não conseguia encontrar. Trabalhei num supermercado, mas a arte já vinha dentro da minha veia", apontou a índia reprovada em testa para a novela "Novo Mundo", na qual Giullia Buscacio será a indígena Jacira.
E a atriz critica o pouco espaço dado aos índios na dramaturgia. "É difícil ter uma carreira sólida. Tem muitos papéis de índios, mas chamam atores que se parecem, não dão muita oportunidade para índios atuarem. Eu adoro fazer papéis de indígena, mas não quero estar presa a isso. Hoje temos índios em diversas profissões, então por que não posso fazer um papel de advogada, professora? Conheço artistas indígenas que são muito capazes, mas não têm oportunidade de mostrar quão bons eles são. Precisamos de pessoas que acreditem e confiem em nós, que nos deem valor do jeito que somos", argumentou.
"Estou procurando não ficar tão ansiosa, acreditando que agora minha vida vai ser às mil maravilhas, que vou ser famosa. Não quero pensar nisso, 'Dois Irmãos' para mim foi uma grande vitória. Todas as personagens que fiz até agora têm a ver com o que eu acredito, que é lutar pela questão indígena, dizer que nós também somos bons, podemos fazer grandes coisas", finaliza Zahy, com possibilidade de atuar na peça "Jamais ou Calabar", no segundo semestre.
(Por Guilherme Guidorizzi)