O câncer de mama - doença cuja prevenção é estimulada no Outubro Rosa - ocorre, na maioria das vezes, com mulheres a partir dos 40 anos, o que faz com que muitas mulheres mais novas não saibam que a doença pode acometê-las, até mesmo na gravidez. Lyana Cabral, de 30 anos, enfrentou um tumor maligno no seio durante sua primeira gravidez e dividiu com o Purepeople sua vivência. Ela descobriu a gestação aos três meses e sentiu um pequeno nódulo. "Ele sempre aparecia na época da menstruação, eu menstruava e ele sumia. Como eu não sabia que estava grávida e o carocinho estava ali, eu achava que iria menstruar. Aí descobri a gravidez ele não saiu. Foi aí que achei que alguma coisa estava estranha, não era normal", relembra a professora, moradora de Campos dos Goytacazes.
Lyana, então, se viu diante de outros sintomas. "O bico ficou invertido, a mama ficou muito vermelha, com aspecto de casca de laranja. Então fui falar com minha ginecologista, já estava com uns 3 meses e meio. Ela pediu um exame e falou para eu procurar um mastologista. Eu só conseguir fazer os exames um mês depois", conta. Sob suspeita de um câncer hormonal, ela iniciou o tratamento no primeiro trimestre da gravidez. "Nos exames, não mostrava o resultado, porque a produção de leite impedia o diagnóstico, eles mostravam que havia a possibilidade de ser câncer. A minha mastologista, depois de um tempo de investigação, disse que tudo indicava o câncer e recomendou que a gente inicia-se a quimioterapia, porque se desse metástase, ela não ia conseguir me tratar", explica a professora.
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A falta de informação sobre o câncer durante a gravidez causou um baque inicial, mas o tratamento ter sido iniciado em pouco tempo foi fundamental. "Foi aquele choque inicial: grávida pode ter câncer. Tinha 29 anos, sempre cuidei da minha saúde, nunca tive uma alimentação errada... Câncer gestacional, o que é isso? A confirmação veio quando eu estava com cinco meses. Quando eu não sabia o que eu tinha, estava muito nervosa, porque eu sabia que tinha alguma coisa de errada e não sabia o que era. Eu ficava preocupada: 'Meu Deus, o que vai acontecer comigo e com a minha bebê?' Mas depois que a médica disse que era câncer, aquilo me trouxe um estranho alívio", afirma Lyana, destacando: "Fiquei aliviada porque dali em diante, eu sabia que tinha como tratar: a partir do momento que ela falou que era câncer, eu já fui trabalhando na minha cabeça que eu ia ficar careca, que aquilo não poderia me afetar".
Apesar de ter encarado de modo tranquilo a possibilidade de ficar sem os fios, Lyana quis fazer um ensaio de gestante com o cabelo grande e cacheado, um dia antes de sua primeira sessão de quimioterapia. "Eu não sabia se eu ia gostar de mim, me sentir bem careca. Então, às pressas, eu consegui fazer o ensaio com o cabelo, um fotógrafo amigo meu", relata a fluminense, que não quis raspar o cabelo logo de início. "Fui deixando cair, cair... até o momento que eu me olhei no espelho e me achei horrorosa. Como estava muito falhada, decidi raspar... E até brinco porque não teve aquela música 'Love By Grace', da novela, não teve chororô, eu estava muito mal com meu cabelo todo falhado", afirmou. Assim que se viu sem cabelo, Lyana viu nos produtos de beleza alguns aliados. "Depois que raspei, me olhei no espelho e gostei do que vi. A primeira coisa que eu fiz foi fazer uma maquiagem e comecei a tirar fotos minhas. Quis me sentir bem e bonita, foi muito natural", afirmou Lyana, que dispensou a peruca - recurso adotado por muitas mulheres e fornecido de forma solidária por diversas instituições: "Comecei a usar lenços, porque senti que de peruca, eu não era eu mesma".
Com o avançar da gestação, a falta de relatos de mulheres que estivessem vivendo o mesmo que ela persistia: ao procurar na internet, apenas artigos científicos eram encontrados. "Por mais que eles tivessem total credibilidade, os termos não eram diferentes dos meus, não faziam parte da minha vida. Fiquei um pouco perdida. E outro ponto é que aquilo é escrito de uma forma mais objetiva, não é algo que ele mesmo passou. Senti falta e pensei: não é possível que eu seja a única", conta Lyana. Motivada pelo desejo de encontrar histórias semelhantes, Lyana criou a página "Câncer Gestacional tem Cura", que tem mais de 2,5 mil curtidas no Facebook e mais de mil seguidores no Instagram: "Criei em agosto do ano passado, no dia da gestante. Eu já tinha pensado em criar, mas meu marido inicialmente ficou com um receio inicial, com medo das pessoas ficarem de pena. Falei: 'não tem para onde esconder, estou careca, barriguda...' Não tinha porque esconder. Aí um dia acordei e vi que era o dia da gestante, achei que era o dia propício para lançar a página".
Além de ajudar em seu tratamento, os relatos também agregaram a outras mulheres. "Hoje nós temos um grupo no Whatsapp com 15 mamães que passaram ou estão passando por essa situação. E ali a gente troca tudo, dúvidas sobre o tratamento, com os bebês, a gravidez. E falo até que cruzou o Atlântico, porque uma das mães está em Portugal", diz Lyana. Segundo ela, foram duas principais diferença durante o tratamento da doença foi: a ausência de corticóides e a radioterapia adiada até o nascimento da filha. "Durante a quimioterapia, eu não tomei corticóide para não amadurecer o pulmão do bebê. E, para falar a verdade, enquanto eu estive grávida, eu não tive nenhuma reação à quimioterapia, poderia ter tido enjoo, diarreia, afta... Não fosse a perda de cabelo, ninguém falaria", detalha a professora que chegou a questionar os médicos, sem receber uma resposta: "Não tem explicação, não tem. E isso aconteceu com outras mamães. A gente fala que o bebê estava protegendo a gente de tudo".
O turbilhão de emoções, característico das grávidas, aconteceu após o nascimento da filha para Lyana. "Quando eu estava grávida, meu foco era ficar bem, emanar toda a energia positiva, pedir para Deus. Era acreditar ou acreditar. Agora que a poeira baixou e graças a Deus eu não tenho mais o câncer apesar de continuar o tratamento, é como se aquela emoção tivesse ficado em uma caixinha e agora, ela se abriu", conta a mãe de Maria, hoje com 11 meses. A mastectomia, no caso de Lyana, estava prevista para durante a gravidez, mas precisou acontecer depois do nascimento da filha. "O tumor ficou muito grande, então tentaram diminuir ele com a quimioterapia. Até perguntei se tinha necessidade de tirar o outro, de modo preventivo, mas minha mastologista disse que não. A retirada do seio, em si, não me causou estranhamento: tem muitas mulheres que tem dificuldade, não conseguem se olhar no espelho... O que para mim foi mais dolorido foi não poder cuidar da minha filha por um tempo. Não podia pegar ela no colo, não levantava o braço... Foi um mês sem fazer nada, depois comecei a fazer fisioterapia, comecei a ganhar movimento de braço e pude pegar a bebê sentadinha para acalmar meu coração".
Por conta da mastectomia após o parto, Lyana não conseguiu amamentar. "Mas tem mulheres que conseguiram. As duas mamães que eu sei que conseguiram amamentar, fizeram a mastectomia quando estavam grávidas. E a explicação que a minha médica me deu foi a que, pelo fato de meu câncer ser hormonal, se eu amamentasse, o hormônio para a produção do leite, iria aumentar o câncer", conta. A dificuldade perante a amamentação afetou a fluminense, mas, com o tempo, ela buscou outras formas de estabelecer o afeto com a bebê. "Isso me pirou um pouco, confesso. Já era um desejo meu engravidar, eu tinha uma série de expectativas, queria fazer parto natural, não consegui, não consegui amamentar... E esse fato (não amamentar), especialmente, me demandou um trabalho mental muito grande. Cheguei a pensar que ela não ia me reconhecer, mas fui vendo outras formas de ela perceber que eu era mãe dela, valorizando o toque, usei o sling o tempo todo, para ela ficar pertinho de mim, sentir as batidas do meu coração", explica.
(Por Marilise Gomes)