A tragédia da Boate Kiss completou 10 anos no último dia 27 e para marcar a data, uma série e um documentário foram lançados para relembrar os detalhes do incêndio que matou 242 jovens na cidade de Santa Maria, no Rio Grande do Sul. Com o assunto no centro das discussões novamente, uma teoria macabra sobre o incidente voltou a tomar conta da web: a mulher de vermelho.
Existe uma lenda que circula por Santa Maria que afirma que sobreviventes da tragédia relataram terem visto uma mulher vestida de vermelho indicando o local da saída. No entanto, ela estaria apontando para o banheiro ao invés da porta para deixar o local. Vale lembrar que foi no banheiro onde muitos corpos foram encontrados.
A história macabra ganhou força nos últimos dias graças ao relato da fisioterapeuta pediátrica Jéssica Duarte. Ela tinha 20 anos quando conseguiu escapar com vida da Boate Kiss. Hoje, ela vive em Curitiba e utiliza um perfil no Instagram para divulgar seu trabalho. Com a repercussão dos conteúdos sobre a tragédia, ela decidiu compartilhar sua experiência enquanto sobrevivente.
Jéssica, então, foi perguntada sobre a lenda da mulher de vermelho e deu sua versão da história. Ela relatou não ter visto a tal moça dentro da boate, mas, sim, no hospital. A jovem passou 25 dias na UTI por conta das fortes queimaduras; ela teve cerca de 40% do corpo queimado e ainda traz cicatrizes visíveis na pele.
Segundo Jéssica, ela tomava fortes remédios por conta da dor e, mesmo assim, permanecia agitada, não conseguia descansar e chorava compulsivamente, especialmente, após receber as medicações.
"Eu não conseguia descansar porque toda vez que eu fechava o olho eu via uma mulher de vermelho e eu via que ela me chamava pra um lugar muito ruim. Então, eu não gostava de fechar meus olhos porque toda vez que eu fechava eu via essa mulher de vermelho me chamando e era uma energia muito ruim. Eu não queria descansar porque eu não queria ver a mulher de vermelho", contou.
Jéssica não esconde a possibilidade de esta visão ser fruto de uma alucinação por conta das dores e do efeito dos remédios. "Altas doses de remédio, muita dor, alucinação é completamente normal", frisou.
A fisioterapeuta ainda conta que ouviu a história da mulher de vermelho circular, mas não lembra de onde surgiu este rumor. "Gente, isso é boato, eu não sei se é real porque eu não a vi lá... Diz que muita gente foi em direção ao banheiro e morreu no banheiro porque existiu uma mulher de vermelho chamando as pessoas para o banheiro dizendo que ali era a saída", contou.
A história da mulher de vermelho endossou outra teoria da conspiração, que relaciona coincidências da tragédia da Boate Kiss com o Nazismo, cujo bandeira era, justamente, de cor vermelha.
No banheiro do local, existiam imagens de diversas figuras históricas conhecidas por promover matanças. As fotos ficavam no mictório masculino, exatamente no local onde a urina seria despejada. Entre esses rostos conhecidos, estavam os de Osama Bin Laden e Adolf Hitler.
A tragédia da Boate Kiss aconteceu no mesmo dia em que se celebra o Dia Internacional em Memória das Vítimas do Holocausto, 27 de janeiro. As mortes aconteceram por inalação de gases tóxicos, entre eles, o cianeto, utilizado nos campos de concentração nazistas. Vale reforçar que são apenas coincidências. Não existe nenhuma linha de investigação da Polícia que associe a tragédia ao Nazismo.
No entanto, muitos internautas apontam, também, o caráter de racismo religioso implícito na história da mulher de vermelho, visto que a imagem descrita levou muita gente a associar à Pombagira, uma entidade da Umbanda, cuja representação mais famosa é uma mulher vestida de vermelho.
No Twitter, internautas levantaram debates sobre o assunto. "Impressiona como vocês sempre encontram uma válvula de escape pra expressar a intolerância religiosa de vocês", escreveu uma usuária. "Eu não vou nem falar o que eu acho das pessoas falando que viram uma mulher de vermelho porque o caldo sempre entorna pro lado do racismo religioso", escreveu um "tuiteiro". "Coisas espirituais existem, mas além de não compactuar com intolerância religiosa, não esqueçam os verdadeiros culpados. É da injustiça que precisamos ter mais medo", pontuou um perfil.
O jornalista Marcelo Soares, que participou da cobertura da tragédia em 2013, classificou como "desinformação" a volta da história da mulher de vermelho e detalhou de onde pode ter surgido este rumor.
"Em 2013, uma moça claramente desequilibrada passou uma tarde onde ficava a imprensa tentando empurrar essa [história]. Por causa da cobertura, eu estava em contato com vários sobreviventes, pessoas que saíram no comecinho e se salvaram. Ninguém viu essa suposta mulher. Ela só existiu na imaginação de uma moça desequilibrada nível ficar gritando 'vocês precisam me entrevistar'", relatou o jornalista.