Autor de grandes sucessos da teledramaturgia brasileira, como "Chiquinha Gonzaga" (1999), "O Salvador da Pátria" (1989) e "O Casarão" (1976), Lauro César Muniz está sem emissora. Seu contrato com a Record encerrou-se em dezembro e não foi renovado. O autor estava no canal desde 2005, quando deixou a Globo em meio a brigas, após ficar cinco anos tendo sucessivos projetos recusados.
Na Record, Lauro escreveu as bem-sucedidas "Cidadão Brasileiro" (2006) e "Poder Paralelo" (2009). Essa última, inclusive, foi responsável por levar Gabriel Braga Nunes e Marcelo Serrado de volta à Globo, com status de protagonistas. Mas, em 2012, fracassou com "Máscaras". A novela foi rejeitada pelo público, teve que ser encurtada e fez a audiência despencar.
Até hoje, a Record busca os dois dígitos de audiência que mantinha antes da novela. Junto com o fim do contrato, Lauro também teve cancelado um projeto de minissérie sobre o maestro Carlos Gomes.
Em entrevista ao Purepeople, o autor comenta sua saída do canal, relembra o fracasso de "Máscaras", fala sobre política e elogia o ex-patrão, o bispo Edir Macedo. "É um religioso muito aberto e tolerante. As pregações do senhor Macedo são muito abertas", opina. Confira o bate-papo.
Purepeople: Ficou surpreso com a não renovação de seu contrato?
Lauro César Muniz: Quando "Máscaras" foi lançada para a imprensa fiz uma declaração de que seria minha última novela. Como permanecer sem fazer telenovelas? Eu já havia feito uma reunião com a cúpula da emissora, em que apresentei uma minissérie sobre Carlos Gomes, mas, quando houve a mudança da direção artística, fui comunicado que o projeto não seria produzido. Como meu contrato estipulava o término em 31 de dezembro, estava claro que não haveria renovação.
Purepeople: Mas quais foram os motivos alegados? Financeiros?
LCM: A grade de dramaturgia está inteiramente definida para 2014 e 2015. Eu era o autor mais bem pago da emissora e ficaria dois anos à espera. Como renovar o contrato de um autor sem projeto? Seria um absurdo pagar um salário elevado por dois anos.
Purepeople: E como avalia a contratação da Sabrina Sato a peso de ouro?
LCM: Ela vai ocupar outro projeto na emissora. Acho que a teledramaturgia não é o setor mais privilegiado.
Purepeople: Qual saída gerou mais desconforto? Agora ou a da Globo, em 2005?
LCM: A da Globo, claro! Saí de lá machucado, humilhado. Na Record minha saída não gerou nenhum tipo de conflito. Apenas a frustração de não fazer a minissérie sobre Carlos Gomes.
Purepeople: Em "Poder Paralelo" (2009), cenas de sexo foram cortadas por mando de executivos da Igreja Universal, como divulgou a imprensa na época. O que aconteceu de fato? Houve censura?
LCM: Um tipo de postura da emissora com relação às cenas de sexo e violência, mesmo no horário tardio das 22h30. Os cortes não tiveram relação com religião. Mesmo assim, quanto a isso, acho que já houve mudanças de atitude. "Máscaras" não foi censurada, por exemplo.
Purepeople: Sendo ateu, você não titubeou ao ir para a Record?
LCM: Logo que cheguei deixei bem claro que tinha uma visão materialista do mundo, muito diferente de todos os pastores e bispos. Por tudo que ouço do senhor Edir Macedo, acho que, ao contrário, ele é um religioso muito aberto e tolerante. Não há nenhum tipo de preconceito norteando a emissora. As pregações do senhor Macedo são muito abertas. Já ouvi muitas vezes chamamento da Igreja Universal a ateus, homossexuais, pessoas de outros credos.
Purepeople: Você já declarou que o texto de "Máscaras" era muito sofisticado e que, em Portugal, a novela ficou em primeiro lugar. O público brasileiro ficou burro?
LCM: Não, são públicos diferentes. "Máscaras" foi líder de audiência em Portugal em um canal por assinatura. A Record orienta sua programação para as classes C e D. "Máscaras" era sofisticado para este público. Minha novela tinha um padrão diferente do público alvo da Record.
Purepeople: E o tão falado beijo gay nas novelas? Ele é necessário ou virou mais um mito do que uma necessidade?
LCM: Uma bobagem. As emissoras estão fazendo um cavalo de batalha por nada. Já vimos vários beijos gays na TV e o mundo não acabou.
Purepeople: Sendo ex-membro do Partido Comunista, como avalia as recentes condenações do caso mensalão?
LCM: Foi um julgamento político. Muita injustiça foi cometida. A lei foi atropelada pela euforia de se punir o grupo. Em um país em que o José Dirceu e o (José) Genoíno estão presos e o (Paulo) Maluf está negando ter fortuna escondida em paraísos fiscais, alguma coisa está muito errada.
Purepeople: Suas novelas sempre foram marcadas por tons políticos. Se fosse convidado a escrever um roteiro de filme sobre o mensalão, aceitaria?
LCM: Aceitaria fazer um filme sobre o José Dirceu. Já falei com ele a respeito dois anos atrás. Se ele topar, ainda, eu faço.
Purepeople: Você é conhecido por ser um homem de opiniões fortes. Para fechar, aos 75 anos, teme-se o que falar?
LCM: Não temo. Já fui prejudicado demais por falar o que penso. Se sempre fui assim, como mudar aos 76 anos? Este mês farei 76... Não tenho juízo mesmo (risos)!
(Por Anderson Dezan)